segunda-feira, 11 de junho de 2012

Memórias



OS ANJOS DA VIDA DA GENTE

           Quando o pai dos meus filhos resolveu ir embora (e essa foi a melhor coisa que ele poderia ter feito), ele chamou o dono de uma loja de móveis usados e vendeu tudo que era nosso. Tudo. Sem fogão, sem camas, até para os meninos. É claro que chorei, é claro que me desesperei. Mas foi só por um momento. Arregacei as mangas e comecei a luta. Um passo de cada vez. Um dia de cada vez. Não havia expectativas. Não havia esperanças.
           Trabalhei dia e noite, noite e dia. Não havia tempo para ser mãe. Perdi muito da infância e adolescência dos meninos. Na verdade eles também não viveram essas fases. Não teve como. Não eram permitidos sonhos. Toda a energia era gasta em sobreviver.
 Devo dizer que aos poucos foram aparecendo os anjos. Todos aqueles que me ajudaram. Não dá prá dizer quantos. Eu costumo brincar que se ganhasse na megasena e fosse retribuir a todos  não sobraria nada. Havia uma senhora, Clarice, que ficava esperando os meus filhos no caminho da escola e lhes dava merenda. Ela era empregada doméstica como eu porém, tinha uma situação financeira melhor que a minha. Foi dessa maneira que eles conheceram iogurte, biscoitos recheados, essas coisas que as crianças gostam. Não posso me esquecer de Vera, que sempre me dava pão, leite... Minhas primas Marília e Lilia... Tantas,  tantas...
             Meu cunhado deu-me duas camas onde dormíamos os quatro. Era apertado e eu queria pelo menos mais uma cama. Era época de Natal e havia uma promoção na cidade – Natal dos Sonhos – que bastava escrever uma cartinha para o Papai Noel e ser sorteado para ganhar e realizar o seu sonho.  Eu mandei "nnnnnnn" cartas na esperança de ganhar a cama. Não ganhei. Na época trabalhava de doméstica na casa do presidente da Ascipam – Associação do Comércio de Pará de Minas. No dia seguinte ao sorteio conversando com minha patroa sobre o sucesso da promoção, fiz um comentário a respeito de minha decepção por não ter conseguido ganhar. No domingo seguinte fui surpreendida com a chegada de meus patrões em minha casa. Com a cama, o colchão e até os lençóis. Digam-me, não são anjos?!

                                                                                                                Lécia Conceição de Freitas

2 comentários:

  1. E conmforme fui lendo teu texto não teve como não me emocionar. Mulher guerreira vc , que apesar das dificuldades , venceu.Criou os filhos e consegue ser grata aos anjos q apareceram em sua vida.

    Parabéns !!! Admiro isso !!!

    Beijinhos

    Ana

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    1. Obrigada, Ana! Foi difícil, graças a Deus passou. Não posso reclamar da vida, pois foram muitos que me ajudaram. Além disso sou bem feliz e tento mostrar aos meninos o quanto isso é importante. São jovens, adolescentes, é complicado o amadurecimento mas eu sei que vão conseguir! Bjs,Lécia

      13 de junho de 2012 10:55

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